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Por que greve estudantil?

Essa pergunta pode ser respondida de diversas formas. Uma das respostas, talvez a que mais se adeque ao nosso pensamento é: porque nós nos importamos. Estudar na Universidade Federal do Rio de Janeiro está a cada dia mais difícil. Os alunos e funcionários são tão vítimas quanto a Instituição. Vítimas de um programa político expansionista falido que o Governo Federal ainda tenta impor. A expansão é necessária. Estudar na UFRJ não deve ser um privilégio. Mas a expansão que nós queremos é aquela que vem acompanhada de suporte, que é qualificada e conta com melhoras na estrutura.

Hoje, a UFRJ recebe estudantes de todo o país, através do SISU, mas não se preocupa com as particularidades desses estudantes. Onde eles vão ficar? O que eles vão comer? Como eles vão se manter em uma das cidades mais caras do mundo? Todas as respostas que recebemos são as mesmas: falta verba. Mas não vamos mais aceitar essa resposta. Em 2015, o lucro dos bancos apenas no 1º trimestre foi recorde. O Governo precisa de mais dinheiro em caixa e, para isso, prefere cortar verbas da educação a taxar o lucro dos bancos. Como se o orçamento destinado à educação fosse muito alto, nesse ano o Governo Federal aprovou cortes que ultrapassam os incríveis R$ 9 bilhões de reais. Cortes que refletiram diretamente na nossa vida, imediatamente. Há alunos sem bolsas, há trabalhadores sem salários, há cursos que não tem material essencial para trabalhar (Gastronomia não tem uma cozinha, Gestão Pública para o Desenvolvimento Econômico e Social sequer possui salas para ter aula, as argilas para um dos cursos da Escola de Belas Artes estão contaminadas por excreções de ratos). Na Psicologia, assim como em muitos outros cursos, estudamos em containers, que estão para ser retirados por falta de pagamento. Não temos laboratórios, temos que nos locomover por três campi diferentes, muitas vezes com um intervalo de 10 minutos para chegar de um a outro, sem ônibus internos o suficiente, vagando de sala em sala, de campus em campus, para estudar. A situação é ainda pior nos pólos de Xerém e Macaé: Em Xerém, em vez de prédios, temos um campus todo feito de lata (que, por falta de manutenção, está desabando). A fonte de energia, o diesel, acabou e todos os alunos estão sem aulas. Macaé quer bandejar, assim como nós da Praia Vermelha. No Centro, temos o IH, IFCS e FND e a Escola de Música. Todos sofrendo com o descaso e falta de manutenção e também sem comer. A conjuntura é ruim no CAp, na Praia Vermelha, em Xerém, Centro, Macaé e no Fundão. A política de assistência estudantil é ineficiente pela falta de verba, não há Moradias Estudantis para todos que precisam e a que existe hoje, na Ilha do Fundão, está em situação precária.

Nós não podemos continuar com as aulas como se tudo estivesse bem. Fingir uma normalidade enquanto os alunos da UFRJ estão deixando de estudar por não ter como comer na Praia Vermelha, por não terem dinheiro para pegar o ônibus ou tirar xérox é inadmissível.

A mobilização que nós estamos construindo é uma resposta: chega! Queremos mais investimento para educação pública e queremos isso pra ontem. Estamos parando essa Universidade porque cansamos de passar fome, de não ter onde morar, de não ter condições mínimas para viver no Rio de Janeiro e na UFRJ. Estamos parando a UFRJ porque nós, futuros psicólogos, não admitiremos olhar pro lado e ver nossos colegas de graduação abandonando seus sonhos e voltando para suas casas sem o seu diploma e sem a experiência universitária.

Para além de todas as nossas pautas estudantis, estão também as pautas dos nossos companheiros de todos os dias, sem os quais a Universidade sequer abriria suas portas. Os trabalhadores cujas funções foram terceirizadas, que são a classe “mais nova” na universidade, deram aulas nos últimos meses. Ensinaram-nos sobre resistência, luta e mobilização. Eles, que são os porteiros, seguranças e equipes de limpeza, ficaram meses com atrasos e faltas de pagamento, clamando por cestas básicas e doações para poderem sobreviver. Será possível assistir às aulas em paz, sabendo que ela tem sido mantida por trabalhadores em situação análoga à escravidão?

Será possível continuarmos indiferentes ao fato de que esses trabalhadores têm sofrido humilhações diárias, fome, problemas de saúde, sendo despejados de suas casas? Que profissionais nós nos propomos ser? Que tipo de formação de pessoas e psicólogos estamos construindo? Que psicologia é essa que a gente aprende dentro de uma bolha? Outros companheiros nossos do dia a dia, os Técnicos Administrativos, deliberaram greve na última semana, reivindicando também, entre outras coisas, melhores condições de trabalho e salários dignos.

Nesse cenário de caos, os docentes da UFRJ, em assembleia geral, votam contra a sua greve. Será que nós convivemos no mesmo espaço? Será que a crise estudantil e dos terceirizados não afeta os docentes? Não é vista?

Entretanto, obtivemos uma vitória: os alunos, empoderados mais que nunca, votaram pela sua própria greve. Hoje, estamos parados, por uma UFRJ melhor. E pelos professores, que não tiveram coragem para parar. E pelos terceirizados, que sofrem todos os dias com o assédio e falta de pagamentos. Pelos técnicos, que tem suas pautas pendentes. E por nós, que cansamos de sofrer nessa Universidade elitista, racista, machista e preconceituosa.

O nosso texto foi construído com várias perguntas, assim como a nossa vida na UFRJ é. E, até que nossas pautas sejam atendidas, só temos uma resposta: GREVE! Entramos nessa luta junto com os terceirizados e com os técnicos e esperamos pelos professores. Entramos nessa luta com a UERJ, UFF, UNIRIO, CEFET e mais de 20 Universidades pelo país. Entramos nessa luta porque, a UFRJ, como maior universidade federal desse país, não pode se calar diante tamanho descaso com a educação pública.

Acima de tudo, entramos nessa luta para que ninguém fique pelo caminho, para que todos possam sair daqui formados Psicólogos. Entramos nessa luta porque nós nos importamos.




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